Conceito
A incapacidade de distinguir as cores tem a designação médica de discromatopsia. Esta alteração da visão é conhecida normalmente por daltonismo.
Esta designação representa uma homenagem ao químico John Dalton que a descreveu pela primeira vez. Este cientista que viveu no Século XVIII era um químico prestigiado que fez variadíssimas descobertas, e que sendo portador deste defeito visual, o descreveu na perfeição.
A forma mais comum de daltonismo é a dificuldade de distinguir o verde do vermelho.
Esta perturbação é normalmente genética, mas existem lesões do aparelho visual e do sistema neurológico que podem originar alterações da visão cromática.
Breves noções de anatomia
O olho humano é um sistema óptico, que capta o estímulo luminoso e o transforma em impulso eléctrico, capaz de ser transmitido ao córtex visual, onde é descodificado e transformado numa impressão sensorial de acordo com a experiência de cada indivíduo.
O estímulo luminoso – luz – é captado sob a forma de onda electromagnética. O sistema óptico do olho humano constituído pela superfície ocular externa (córnea e filme lacrimal) e pelo cristalino (lente) é responsável pela focagem da “onda de luz” de forma a que ela incida sobre uma película neurosensorial muito fina chamada retina. Esta película funciona como uma espécie de filme ou rolo fotográfico, uma vez que é capaz de se deixar impressionar pela luz e a transformar num impulso nervoso devidamente codificado no que diz respeito à forma e às cores dos objectos.
A capacidade da retina para codificar a cor dos objectos deve-se à presença de células nervosas muito especializadas, capazes de captar a luz nos mais variados comprimentos de onda. Estas células chamadas cones (funcionam na presença de luz) e bastonetes (funcionam no escuro) têm pigmentos que são impressionados pelos vários comprimentos de onda da radiação electromagnética - luz – e desta forma reconhecem e transmitem ao cérebro a cor dos objectos visualizados.
Na área central da retina existe uma predominância de cones sensíveis ao vermelho e verde. Esta é a razão pela qual foi introduzido uma terceira luz de STOP no meio da traseira dos automóveis (luz vermelha na retaguarda dos veículos automóveis); esta luz encurta o tempo de reacção à travagem em 0,2 segundos.
Um pouco mais perifericamente aumenta a sensibilidade ao eixo azul-amarelo. Esta é a razão pela qual a luz de reserva de combustível é amarela; facilita a sua percepção sem olhar directamente para ela. Também nas condições de movimento se obtém boas condições de contraste entre as cores azul e amarela. É por esta razão que em Portugal se usam nas estradas placas com setas amarelas e pretas para indicar a lateralidade nas portagens, nos desvios etc.; é também por esta razão que actualmente as ambulâncias do INEM estão pintadas de azul e amarelo; o mesmo acontece também com as bolas de volley-ball….etc..etc
Genética
O Daltonismo é uma doença recessiva ligada ao cromossoma X.
O genoma humano é constituído por 23 pares de cromossomas (46 cromossomas), dos quais um par está ligado ao sexo. Este par referente ao sexo tem um cromossoma X e outro Y no sexo masculino (XY) e dois cromossomas X no sexo feminino (XX).
Durante a fecundação cada indivíduo recebe um cromossoma do pai e outro da mãe para formar os seus pares de cromossomas.
O termo recessivo significa que para um filho ter uma característica (doença) transmitida dos pais é necessário que herde dois cromossomas doentes dos pais.
Uma vez que os indivíduos do sexo feminino herdam um cromossoma X do pai e outro cromossoma X da mãe seria necessário que ambos tivessem defeito para terem a doença, o que é muito raro. Contudo estes indivíduos do sexo feminino podem herdar um cromossoma X doente e outro sem doença; neste caso não tendo a doença são portadores e podem transmiti-la aos filhos. No caso dos indivíduos do sexo masculino desde que herdem o cromossoma X doente da mãe, serão sempre doentes uma vez que só têm um cromossoma X.
De acordo com este padrão de transmissão uma mulher portadora (não doente) tem 50% de probabilidades de transmitir a doença a um filho do sexo masculino. Se o filho for do sexo feminino será necessário que o pai também seja doente para que o filho herde a doença. Se a mãe for doente transmite sempre (100% dos casos) a doença a um filho do sexo masculino; aos filhos do sexo feminino transmite sempre um cromossoma doente. A filha só será doente se o pai também o for; caso contrário será apenas portadora.
Os homens nunca são portadores mas apenas doentes. Se for doente transmite o seu cromossoma X doente às filhas que serão doentes ou portadoras conforme herdem da mãe um cromossoma doente ou normal. Aos filhos do sexo masculino nunca transmitem a doença uma vez que só passam o cromossoma Y.
Este padrão de transmissão genética do daltonismo explica porque razão a doença é extraordinariamente rara nas mulheres e relativamente frequente nos homens. De facto cerca de 8% dos homens têm alterações da visão cromática e menos de 0,5% das mulheres são afectadas. Por outro lado 97% dos indivíduos afectados são do sexo masculino.
Clínica
Como vimos, são três as cores principais: azul, verde e vermelho. Por um lado a junção destas três cores dá o branco, e por outro lado todas as outras cores ou tonalidades são o somatório destas três cores.
Daqui se compreende que um erro ou defeito num tipo celular referente a uma destas três cores, resulta num defeito específico dessa cor, mas também terá consequências na composição de todas as outras cores compostas e onde a cor em falta não pode colaborar.
A gravidade do daltonismo é muito variável. Pode ser um defeito extremamente grave com ausência total da visão cromática - visão a preto e branco – nos casos em que praticamente não existem células fotorreceptoras. Nestes casos a acuidade visual é muito má, uma vez que este defeito se acompanha de péssima capacidade de discriminação: são casos de cegueira legal em que se desenvolve nistagmo (movimento de tremulo dos olhos na tentativa de conseguir fixar os objectos).
Felizmente estas formas graves são muito raras, e o que prevalece são as formas leves de daltonismo em que há sobretudo dificuldade de reconhecer cores compostas.
Em termos genéricos podemos dizer que de acordo com o defeito cromático há 3 tipos de daltonismo: protanopia (defeito dos cones vermelhos), deuteranopia (defeito dos cones verdes) e tritanopia (defeito dos cones azuis).
Estas designações são para os defeitos totais; quando o defeito é parcial falamos de Protanomalia, Deuteranomalia e Tritanomalia.
Em todo o caso como vimos estes defeitos acabam por ter consequência nas outras cores que resultam do somatório das cores primárias.
Por outro lado na maioria dos casos estes défices não são absolutos, e embora o defeito exista para determinada cor, o sujeito consegue muitas vezes distinguir estas cores para as quais tem defeito embora as veja menos saturadas. A própria luminosidade pode alterar a percepção cromática do daltónico.
O quadro representado em baixo e á esquerda é um original do pintor Mondrian. Os dois quadros à sua direita são reproduções feitas por um daltónico a duas horas diferentes do dia com luminosidades diferentes; aqui ficam patentes as alterações da saturação das cores que resultam do defeito cromático e dentro do defeito cromático da luminosidade.
Curiosa é também a forma como pintam os daltónicos. Evitam habitualmente as cores de transição dando um cunho quase monocromático às suas pinturas; outras vezes envolvem as cores em contornos escuros para evitar essas transições.
A grande maioria dos doentes apresenta apenas anomalias de uma cor – dicromacia, uma vez que restam duas cores ou de duas cores – monocromacia - uma vez que só reconhecem uma cor.
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